Estou exausta de viver com medo e de deixar de viver para sobreviver a esta pandemia. Nem a Aids me limitou tanto a experiência humana com todos seus estigmas, preconceitos, hipocrisias e ignorância. Viver a epidemia de Aids dentro da pandemia de Coronavírus é extenuante. Ainda mais para quem já sobreviveu a essa doença e se recusa a reviver o inferno de uma internação hospitalar com risco iminente de morte quando ainda se há tanta vida pela frente. E eu quero viver porque ainda tenho muitos planos. Mas viver quê vida?!? Quê vida é esta que eu quero viver? Será que ela um dia voltará a existir?! Porque eu não quero mais viver esta vida de privação dos planos, dos sonhos, do toque, do abraço, do sexo…
Eu já passei por isso com a Aids e doeu demais, foram 7 anos infernais para eu conseguir me libertar da prisão do medo. E, de repente, me meti novamente no calabouço, pois não tenho pra onde ir. Não tenho casa na praia, não tenho fazenda, não sou herdeira de nada a não ser das minhas próprias decisões e não quero nunca mais correr o risco de morrer por conta de uma infecção viral.
Evidente que minha cor e meu privilégio de classe são determinantes para que eu possa me isolar em casa e ter sempre comida na mesa, diminuindo drasticamente os riscos de contrair covid-19. Home Office, álcool, iFood. Comer, inclusive, é o único prazer que tenho tido há mais de 365 dias de isolamento e eu decidi não me negar este momento de satisfação e alegria quando descobri que minha vida de viagens e rolês, sempre tão intensa, tinha se transformado em uma ponte-aérea da sala pra cozinha.
Não seis quantos quilos engordei, calculo mais de 10, mas há pelo menos 10 quilos atrás eu decidi que eu não ia me privar de comer coisas gostosas e que eu iria assumir os BOs e trabalhar na terapia uma maneira de amar minha nova forma diante do espelho. Eu tô tentando, real! Este ensaio de fotos, inclusive, é uma tentativa de resgate da minha auto-estima por pura e simples sobrevivência.
Durante muitos anos eu sempre diria que assim que eu emagrecesse, minha vida ia desandar. Sempre calculei todo após o emagrecimento: aquela viagem, aquele cabelo, aquela roupa, aquele crush. Há alguns anos já não vivo mais assim, mas preciso sempre me lembrar que meu corpo deve ser amado e não odiado, independente de seu tamanho e forma, SEMPRE!
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